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Baú de ideias malucas de Rubens Torres
Até dia 28 de fevereiro estarão abertas as inscrições no curso de Especialização em "Discurso e Leitura de Imagem" oferecido pela UFSCar. A atividade é destinada a pessoas que atuam ou buscam aprofundar conhecimentos com a análise de imagens, em instituições e locais presenciais ou virtuais: escolas, agências de comunicação, universidades, institutos de pesquisas, arquivos, bibliotecas, centros culturais, instituições de patrimônio histórico, dentre outros.
O objetivo do curso é oferecer estudos advindos do campo das linguagens aplicados em análises dos discursos imagéticos, considerando-se, para tanto, três grandes modalidades de produção: as imagens fixas, as imagens em movimento e as imagens no virtual. Para a realização deste curso foram convidados docentes dos departamentos de Ciência da Informação, Imagem e Som, Letras e Sociologia da UFSCar, além de professores dos cursos na modalidade da Educação a Distância. Se, por um lado, as perspectivas teóricas e conceituais dos docentes dessas áreas são diferenciadas, por outro, o que os une é que há anos eles pesquisam sobre leitura e análise dos discursos imagéticos, aplicando seus conhecimentos em diversos textos: quadros, fotos, história em quadrinhos, filmes, imagens na internet, transmídia, na educação a distância, nas imagens em 3D.
Os interessados podem fazer inscrição agendando entrevista na secretaria do Laboratório de Análise do Discurso da Imagem (LANADISI), situado no Departamento de Ciência da Informação da UFSCar, pelo telefone (16) 3351-9469. O funcionamento da secretaria será de segunda a sexta-feira das 13 às 18 horas, exceto nos feriados. Na entrevista será necessário apresentar currículo impresso. São oferecidas 40 vagas e, deste total, 5% são destinadas a funcionários da UFSCar.
Mais informações podem ser obtidas no site do curso, pelo telefone (16) 3351-9469 ou pelo e-mail discursoeimagem.ufscar@gmail.com.
Observem atentamente a pintura acima e pensem: o que ela nos lembra?
Riscos sem muita forma, figuras humanas estilizadas, mistura de várias cores com pinceladas não muito precisas... não lembra um desenho infantil?
Pois é, não só lembra como é um dos principais motivos que levou Kandinsky a realizar estudos sobre o abstracionismo e a desenvolver essa nova forma de arte. Kandinsky queria descobrir como é que nascia a consciência estética no ser humano e o porque ela desaparecia com o tempo.
Vejamos o que diz Argan, em seu livro “Arte Moderna”, sobre a pintura de Kandinsky:
“Em 1910, Kandinsky estava com quarenta anos e contava com um belo passado de pintor figurativo. De repente, esquece o ‘ofício’ e começa a rabiscar como uma criança de três anos que ganhou papel, lápis e tintas [...] Kandinsky se propôs reproduzir experimentalmente o primeiro contato do ser humano com um mundo do qual não se sabe nada, nem sequer se é habitável [...]. Essa primeira experiência da realidade é denominada pelos psicólogos como estética: uma experiência a que corresponde um tipo de comportamento. A criança, sem dúvida, percebe, recebe sensações do mundo exterior; mas a percepção não se define como noção, traduz-se num conjunto de movimentos instintivos, com os quais a criança pega o que a atrai, afasta o que a atemoriza. Se dispõe dos instrumentos necessários, transforma esses gestos em signos, que por sua vez são percebidos; e, como o mundo existe para ela enquanto ela o percebe, ao fazer algo que se percebe, está afirmando sua vontade de fazer a realidade, de existir. Kandinsky [...] se propõe [a] analisar, no comportamento da criança, a origem, a estrutura primária da operação estética. Com efeito, todos sabem que o comportamento estético cessa quando a criança, ao crescer, aprende a ‘raciocinar’: a primeira experiência do mundo, isto é, a experiência estética, é esquecida, transferida para o inconsciente. Apenas poucos indivíduos – os artistas – desenvolvem-na, ligam-na a certas técnicas organizadas, dela extraem objetos a que a sociedade atribui certo valor”.
É preciso buscar a criança que existe dentro da gente para entrar no mundo das obras de Kandinsky.
Vamos tentar descrever o que vemos na imagem.
Apesar de não-figurativa, percebemos formas que lembram figuras conhecidas. Os riscos do lado direito lembram 4 pessoas, duas mais próximas e as outras mais distantes. Há 2 riscos pretos cortando a tela o que nos faz lembrar uma estrada, porque ao lado desses riscos observamos 3 manchas vermelhas que nos lembram casas. Ao perceber essas estradas, vemos que as duas pessoas da direita estão caminhando por elas. À esquerda também vemos algo que lembra tanto uma outra estrada como um rio, formada com riscos pretos, azuis e violácios, com várias ondulações. Pela sua cor azul e pelas outras manchas azuis podemos dizer que representam mesmo as águas de um rio. E reparem que todos os outros riscos pretos também nos lembram estradas e caminhos. Há inclusive um arco-íris à esquerda. A parte superior à direita está pintada de azul e com uma grande mancha colorida de laranja, violeta e amarela, o que nos lembra um sol no céu.
Enfim, todos os elementos nos levam a crer que essa pintura nos leva recordar a imagem de uma paisagem de campo, numa tarde ensolarada. Mas só conseguimos ter essa percepção se olharmos para a imagem com um olhar infantil, como se ela tivesse sido pintada por uma criança, aí a paisagem parece ficar clara para nós. Quanto mais tempo olhamos para o quadro, mais a gente recorda nossa forma de ver o mundo escondida em nosso insconsciente e que nos acompanhava durante a infância.
Viu só como a arte abstrata mexe com os nossos sentimentos e sensações? Com certeza a minha percepção é diferente da sua e é isso que deixa a arte abstrata tão interessante. Comece a observar outros quadros abstratos, busque a sua visão infantil escondida em você e se entregue a essa forma de arte fascinante.
E porque não experimentar também? Peque tinta, lápis, lápis de cor e papel e tente também criar formas e cores que estão escondidas em você. Não procure por sentido, procure expressar o que sente e o que as formas e cores despertam em você. Com certeza será uma atividade interessante e o ajudará a entender melhor a arte abstrata.
Na próxima análise, mais um quadro e mais uma característica de Kandinsky: a música cromática.
Até lá!
Referência:
ARGAN, Giulio Carlo. Arte moderna. São Paulo: Companhia das Letras, 1992.
Não viu a análise anterior? Clica no link abaixo que eu te levo lá:
PS: Peço mil desculpas aos leitores do meu blog pelo atraso na publicação desse post. Estou envolvido na realização de diversas atividades, como a conclusão do meu TCC, estudos para tentar entrar no mestrado e atividades de docência, o que tem consumido muito o meu tempo. Consegui agora escrever mais um pouco sobre Kandinsky mas não vou prometer uma data para o último post dele. Continuem acompanhando que assim que concluir aviso. Semanalmente publicarei algum texto de minha autoria para que o blog não fique parado. E se quiserem também podem acompanhar meu outro blog "A retórica do dragão-de-komodo", lá eu falo de tudo um pouco e está sempre atualizado com alguma reflexão minha. Obrigado e boa leitura!
E o artista escolhido para o mês de julho é:
Wassily Kandinsky
Kandinsky é conhecido como o pai do abstracionismo e analisar seus quadros nos permitirá entender um pouco o que é essa tal de arte abstrata.
Primeiro vamos conhecer um pouco da vida de Kandinsky e o que ele representa para a História da Arte. Depois tentaremos entender o que é uma pintura abstrata para finalmente mergulharmos nos quadros desse pintor.
De acordo com o site Infoescola,
"Wassily Kandinsky, o pioneiro do abstracionismo nas Artes Plásticas, nasceu na cidade de Moscou, em 16 de dezembro de 1866. Filho de pais divorciados, ele foi educado pela tia, optando a princípio pela música, que posteriormente refletirá em seu trabalho como pintor, pois ela lhe confere noções essenciais de harmonia e evolução. Kandinsky seguiu inicialmente as trilhas acadêmicas, formou-se em Direito e Economia na Universidade de Moscou, mas logo depois desistiu desta profissão, encontrando finalmente seu destino nas veredas das artes visuais, ao se apaixonar por uma tela de Monet.
O artista começou a estudar pintura em Munique - nesta época considerada como um centro artístico -, na escola de Anton Ažbè, mas Kandinsky desencantou-se com esta prática artística, pois tinha uma predileção especial por paisagens. Suas primeiras obras refletiam um toque musical e expressavam também temas do folclore russo. Nesse período, Kandinsky conheceu o pintor Paul Klee, dando início a uma grande amizade. No ateliê do Professor Von Stuck ele permanece até 1900; um ano depois o artista funda a Phalanx (Falange), um grupo de artistas, entre eles Stern, Hüsgen, Hecker e Klee. Pouco tempo depois esta associação encerra suas atividades por carência de alunos, mas suas sementes frutificam posteriormente com o nascimento da Nova Associação dos Artistas de Munique (NKVM). Nesta mesma ocasião, Kandinsky inova ao pintar sobre vidro, técnica inspirada na cultura da Bavária.
Na etapa ainda figurativa do artista, a tela "O Cavaleiro Azul (1903)" reproduz um personagem dos contos de fadas, imagem muito comum na infância de Kandinsky, simbolizando o combate entre o bem e o mal, luta e transformação. Este tema se repete nesta fase do pintor. Em 1908, retorna a Munique, onde edita o ensaio "Do Espiritual na Arte", em 1911, no qual apresenta a arte como expressão de um imperativo interior. Nesta década, o pintor realiza os primeiros trabalhos não figurativos, tornando-se assim o primeiro artista no Ocidente a criar uma pintura abstrata. Ele libera as artes plásticas das cadeias convencionais a que elas se prendiam. Com sua atitude inovadora, influencia profundamente não só esta esfera, mas vários outros setores artísticos".
Até esse momento, a pintura buscava essencialmente representar o "Real". Paisagens, pessoas, animais, objetos... enfim, tudo o que "existia" no nosso mundo e que podia ser visualizado era representado nos quadros. Com o tempo, foi-se modificando aos poucos a forma de se pintar, o modo de usar as tintas e dar as pinceladas, mas ainda assim o tema dos quadros sempre nasciam do mundo visível. Em Arcimboldo, artista analisado mês passado, por exemplo, até existe uma originalidade na forma de compor seus quadros, mas ainda assim ele busca representar a realidade e o que existe no mundo.
Aumont, em seu livro "A imagem", nos conta que a pintura foi uma das artes que mais demorou a se desvincular do que era considerado mundo real. A música, por exemplo, se libertou muito tempo antes. O homem sempre teve certa dificuldade em abstrair, em criar coisas e ideias novas e que não condizem com a realidade.
Mas a arte chegou finalmente em um momento em que ela se perguntou: por que não podemos manipular as cores, formas e linhas da nossa maneira, criando formas e figuras novas? Esse questionamento surgiu por causa do surgimento da fotografia e cinema, pois eles assumiram a função de "representar o real" (claro que estou sendo simplista, mas no início essa foi a principal forma de encarar o cinema e a fotografia). Então a pintura viu que precisava ir além, percorrer caminhos novos e encarar uma certa liberdade nunca experimentada antes. Aí nasceu a Arte Abstrata.
Mas a liberdade assusta. Já não era mais preciso seguir tantas regras e isso provocou um choque muito grande na Arte, como nos conta Gombrich em "A história da arte". A arte abstrata juntamente com outras tendências surgidas no início do século XX marcaram o início do que veio a ser chamado de Arte Moderna. Nesse momento, surge um rompimento na forma forma de se pensar a pintura. Antes, o artista era quem ditava as regras e significados de sua obra, ele pensava em um tema, criava a composição e a divulgava, enquanto os seus leitores tinham uma atitude passiva, onde buscavam entender "o que o artista quis dizer com seu quadro". Com a Arte Moderna, e, em especial o abstracionismo, isso modificou completamente. O artista até poderia ter um tema, mas as responsabilidade de dar significação a sua obra passou a ser do seu leitor. Assim, cada quadro poderia despertar impressões diferentes dependendo de quem a observasse. O leitor passou a ter uma atitude ativa. Ou pelo menos deveria, porque até hoje isso não foi bem assimilado pelas pessoas em geral.
Ainda somos acostumados a olhar uma imagem buscando alguma referência com o que consideramos Real. Por isso, a arte moderna é ainda muito mal vista e mal assimilada pelas pessoas em geral, porque se você encara um quadro abstrato, por exemplo, sem ter a noção da importância de ter uma postura ativa e de se colocar na pintura, buscando assim a significação, você perde todo o encanto que ela busca despertar. E fica perdido.
Para ler um quadro abstrato é preciso analisar com muito cuidado e atenção tudo o que está representado. São formas retas ou curvas? Cores escuras ou claras? Excesso de elementos em um lado ou tudo está bem distribuído? Tem um nome ou não? Enfim, qualquer detalhe, por menor que seja, é importe para costurarmos a narrativa que essa pintura quer despertar em nós. E na maioria das vezes ela está fundada em sentimentos e oposições básicas do ser humano, como o amor e ódio, guerra e paz, etc.
Finalmente a arte aprendera a representar o mundo subjetivo do homem, seus sentimentos, sensações e desejos.
E é essa a matéria prima básica que Kandinsky utiliza em seus quadros. Deixarei essa pequena amostra do trabalho dele para você tentar ler. Observe com cuidado esses quadros e tente construir em você o significado deles. Não fique aflito, no começo é difícil mesmo. Fica como um exercício, para que na próxima semana continuemos esmiuçando com mais cuidado um dos quadros desse criativo pintor abstrato.
E a obra de Arcimboldo para análise é "O bibliotecário" (1566):
Arcimboldo realiza um trabalho semelhante ao quadro de Rodolfo (confira a parte 1) e cria uma ilusão utilizando dessa vez elementos que são encontrados em uma biblioteca: livros, marcadores, espanador de pó, óculos e cortina, formando a imagem de um homem, um bibliotecário da época.
Assim, Arcimboldo utiliza elementos que ele acredita representar a essência do retratado. No caso de Rodolfo, os alimentos representam a ilusão do poder. E em "O bibliotecário"?
A representação do bibliotecário é formada por livros organizados e bem cuidados (eles não são sujos e não possuem estragos). Uma cortina encobre parte do que seria o ombro, representando uma capa e também mostrando que os livros, com o bibliotecário, estão protegidos e bem conservados.
Mas assim como no quadro de Rodolfo, não há nada que nos garanta que exista segurança. Um esbarrão e toda a pilha de livros pode desabar. Assim é o homem, vive sua vida na ilusão de uma segurança, mas que é efêmera. Hoje está limpo, mas amanhã poderá estar empoeirado.
Há também um livro aberto representando um chapéu ou peruca. A mente do bibliotecário estaria assim, aberta ao conhecimento, pronta para ser consultada. A forma como o bibliotecário é representado mostra também que a profissão era respeitada e bem vista, afinal só por ser tema de uma pintura nessa época já era um sinônimo de status.
Essas ilusões também estão presentes em diversas outras obras do artista, olhe só:
The Four Seasons in One Head
O ar
A terra
O inverno
Muitas pessoas ao tomarem contato à primeira vez com o trabalho de Arcimboldo o classificam erroneamente como surrealista. Na verdade, seu trabalho hoje está inserido na escola artística do Maneirismo.
De acordo com o site Histórianet, "o maneirismo tem características variadas, difícil de reuni-las e um único conceito.
O termo Maneirismo foi utilizado por Giorgio Vasari para se referir a "maneira" de cada artista trabalhar. Uma evidente tendência para a estilização exagerada e um capricho nos detalhes começam a ser sua marca, extrapolando assim as rígidas linhas dos cânones clássicos.
Muitos críticos consideram que o maneirismo representa a oposição ao classicismo e ao mesmo tempo, manteve-se como tendência artística até o desenvolvimento do Barroco, que marcaria a nova visão artística da Igreja Católica, após o movimento de contra reforma Alguns historiadores o consideram uma transição entre o renascimento e o barroco, enquanto outros preferem vê-lo como um estilo propriamente dito.
Os artistas passam a criar uma arte caracterizada pela deformação das figuras e pela criação de figuras abstratas, onde não havia relação direta entre o tamanho da figura e sua importância na obra (...) Rostos melancólicos e misteriosos surgem entre as vestes, de um drapeado minucioso e cores brilhantes. A luz se detém sobre objetos e figuras, produzindo sombras inadmissíveis. Os verdadeiros protagonistas do quadro já não se posicionam no centro da perspectiva, mas em algum ponto da arquitetura, onde o olho atento deve, não sem certa dificuldade, encontrá-lo. No entanto, a integração do conjunto é perfeita.
E é assim que, em sua última fase, a pintura maneirista, que começou como a expressão de uma crise artística e religiosa, chega a seu verdadeiro apogeu, pelas mãos dos grandes gênios da pintura veneziana do século XVI. A obra de El Greco merece destaque, já que, partindo de certos princípios maneiristas, ele acaba desenvolvendo um dos caminhos mais pessoais e únicos, que o transformam num curioso precursor da arte moderna"
Os principais pintores maneiristas foram: Domenico Beccafumi, Francesco Salviati, Giorgio Vasari, Giuseppe Arcimboldo, Marten de Vos, Cornelis van Haarlem e El Greco.
Futuramente, ao analisarmos algum pintor barroco, perceberemos algumas semelhanças entre o estilo de Arcimboldo e o barroco.
Espero que tenham gostado desse pintor. Existem diversas imagens dele na internet, procurem e tentem conhecer um pouco mais desse artista que passou muitos anos esquecido pela história da arte e só muito recentemente foi "redescoberto".
Mês que vem tem mais. Até lá.
Para ler os artigos já publicados:
O artista selecionado para análise esse mês é Arcimboldo.
Arcimboldo foi um pintor italiano, nascido em Milão em 1527 e falecido em 1593. De acordo com o site Casthalia, "Arcimboldo trabalhou inicialmente com seu pai, no vitral da catedral de Milão. A partir de 1562 morou em Praga, então capital do reino da Boêmia e hoje da República Tcheca, onde consolidou sua carreira como artista. Serviu na corte de Fernando I e de seus sucessores, Maximiliano II e seu filho Rodolfo II, grandes mecenas. Arcimboldo foi admirado como artista pelos três monarcas, tornou-se pintor da corte e chegou a ser nomeado Conde Palatino. Praga transformou-se no século XVI, principalmente por causa de Rodolfo II, em um dos maiores centros culturais da Europa, de intensa e diversa atividade cultural e científica. Seus governantes eram vistos, além de seus domínios, como simpatizantes do exótico. Nesse contexto, as singularidades da arte de Arcimboldo encontraram solo fértil para florescer".
O quadro selecionado para primeira análise é "Rodolfo II pintado como Vertumno, deus romano das estações" de 1590. Vamos ler com calma, procurando perceber cada detalhe da obra. Quanto mais tempo você se dedicar, mais coisas irá perceber.
Então, o que achou? Já conhecia?
A primeira coisa que percebemos nesse quadro é que existe um jogo entre duas possibilidades de sentidos. Em um primeiro momento percebemos que é um retrato de alguém, o tal Rodolfo II. Mas logo vemos que não é uma representação convencional, a imagem de Rodolfo II se forma a partir de um amontoado de legumes, frutas, verduras e flores.
A primeira coisa a saber é tentar descobrir quem foi Rodolfo II.
Rodolfo II foi imperador do Sacro Império Romano Germânico. De acordo com a Wikipedia, ele nasceu em Viena em 1552 e faleceu em Praga, no ano de 1612. "Adotou o calendário gregoriano em 1583. Não conseguiu manter a coesão de seus Estados. Instalou a capital em Praga, atraindo a simpatia dos checos e a hostilidade dos alemães. Haverá revoltas na Áustria 1595-7 e dos húngaros. A partir de 1597 sua saúde declinou e, trancando-se no castelo chamado Hradcany, apaixonou-se pelas ciências e belas artes e se tornou protetor de Tycho Brahé, Kepler, um grande mecenas de seu tempo. Seus irmãos se apoderam do poder. O Arquiduque Matias, vencedor dos turcos, tratou diretamente com eles e obrigou Rodolfo a lhe ceder a Áustria, a Morávia e a Hungria em 1608. O Imperador conseguiu conservar a Boêmia e a Silésia, dando aos súditos protestantes uma carta (lettre de majesté) em 9 de julho de 1609, que lhes concedia, com certas restrições, liberdade de consciência e de culto [...] Rodolfo II foi um dos mais excêntrico monarcas europeus de todos os tempos. Rodolfo colecionava anões e possuia um regimento de gigantes em seu exército. Ele era rodeado por astrólogos e fascinado por jogos, códigos e música. Rodolfo fazia parte dos nobres de seu período orientados pelas ciências ocultas. Patrono da alquimia, financiou a impressão de literatura alquimista".
O mais importante a saber sobre Rodolfo II é que ele foi um grande mecenas de Arcimboldo, bem como Maximiliano II, anterior a Rodolfo. Eles patrocinavam o trabalho de Arcimboldo, porque ambos possuiam gostos e atividades em comum, como o ocultismo. Havia na época em que eles viveram um lugar em Praga chamado Câmara de Arte e Prodígios, que era um núcleo do museu de Praga. De acordo com o site Casthalia: "A Câmara reunia os mais diversos objetos estranhos, registros de pessoas com anomalias físicas (desde anões até gigantes), animais, frutas, legumes de diversas espécies, provindos de todos os continentes. Ali Arcimboldo teve condições de fazer estudos para suas obras, observar o pormenor de cada elemento representado, representando-os em seus mais ricos e finos detalhes".
E foi trabalhando nessa câmara e com o apoio dos mecenas que Arcimboldo encontrou a matéria-prima principal para os seus trabalhos. Ele começou a pintar quadros que criavam verdadeiras ilusões óticas, formando imagens a partir da união de outras.
Ilusão. Uma das principais oposições que encontramos em seus quadros é essa, a ilusão vs. a realidade.
Voltemos ao quadro de Rodolfo II para entender isso. Rodolfo, como vimos, foi um homem muito importante e poderoso do seu tempo. Todos os quadros que representavam grandes homens naquela época e durante muitos anos depois, sempre procuravam valorizar as figuras representadas, mostrando poder, luxo e imponência. E era isso que se esperava de um pintor quando ele recebia uma encomenda de alguém importante. Afinal, naquela época, um quadro era muito caro para ser realizado, era preciso uma fortuna muito grande para alguém bancar o preço das tintas. Se os retratos não saíssem ao gosto dos retratados o pintor correria risco de morte.
E como Arcimboldo retratou Rodolfo? Como um amontoado de frutas e verduras, algo não muito convencional, mas que foi muito bem recebido pelo retratado, porque ele admirava o trabalho de Arcimboldo na câmara e era um entusiasta de tudo o que não era convencional, como vocês puderam perceber nas citações acima.
Elencar todos os elementos que Arcimboldo utilizou na composição deixaria esse artigo enorme, por isso deixo essa missão a você, leitor. O importante é saber que todas as frutas, verduras e legumes utilizados na composição são frescos, possuem uma boa aparência e parecem suculentos. Não há nada que pareça estragado ou podre.
Assim, o homem representado é tão vivo e de boa aparência quanto os alimentos. E todos nós precisamos nos alimentar, é condição vital para a vida. Isso mostra que o poder do imperador também é importante para manter a vida de seu povo. Seu povo precisa dele bem como eles precisam de alimentos frescos e saudáveis para se alimentar. E ele não seria um mal imperador, porque ele teria qualidade e saúde, assim como os alimentos representados.
Porém, tudo o que é saudável e de boa aparência um dia sempre estraga e apodrece. No quadro tanto os alimentos quanto o imperador aparentam uma boa imagem, mas no futuro definitivamente isso irá acabar. Os legumes e verduras irão estragar, as frutas amargarão e as flores e folhas secarão. Bem como o poder de Rodolfo um dia também acabará, sem falar na morte, que é sempre uma certeza na vida do homem.
Se olharmos melhor ao quadro novamente percebemos que existe ainda uma outra fragilidade, todos os alimentos estão amontoados, não há nada que nos garanta que eles estejam firmes e fixos. Ou seja, qualquer esbarrão, chute ou vento pode desabar com tudo. O poder pode aparentar luxo e força, mas na verdade é fraco e pode ser vencido por outras forças. A força vs fragilidade é, assim, uma outra oposição importante do quadro.
Espero que tenham gostado dessa análise. Ainda haverá uma segunda parte, onde analisaremos um outro quadro de Arcimboldo e vamos tentar entender em que escola artística se encontra o trabalho dele.
Até lá! E continue a ler imagens, é sempre bom para a nossa formação e vida!!!
PS: Quem é Vertumno, o deus do título do quadro? Descobri recentemente:
"Divindade romana, de origem etrusca, que presidia a fecundidade da terra, a germinação das plantas, a floração e o amadurecimento dos frutos. Apaixonou-se pela ninfa Pomona. Esta, porém, dedicava-se exclusivamente ao cuidado dos pomares e jardins, recusando a corte de seus numerosos pretendentes. Para conquistá-la, Vertumno apresentou-se a ela sob vários disfarces. Assim, transformou-se sucessivamente em lavrador, ceifeiro e vinhateiro, porém não conseguiu realizar seu intento. Por fim, metamorfoseou-se em velha e captou a confiança da amada. Falou-lhe, então, do afeto que lhe dedicava Vertumno. Ao perceber a comoção da ninfa, mostrou-se a ela sob a forma de um belo jovem, conquistando-a finalmente. As sucessivas transformações de Vertumno representam a mudança ocorrida na natureza ao longo do ano: primavera, verão, outono e inverno. O deus é representado sob os traços de um belo jovem coroado de ervas, portando na mão esquerda algumas frutas e na direita uma cornucópia".
Fonte: "Dicionário de Mitologia Greco-Romana", Abril Cultural, São Paulo, 1973, p. 186, s/ autor. Disponível em: <http://www.brasilcult.pro.br/cursos/sobrev02.htm>. Acesso 27 jun 2009.
Eu iniciei uma pesquisa de iniciação científica em 2006 e continuo com ela até hoje. Estou analisando o uso da cor nos filmes do Tim Burton e como a cor é um elemento importante para a análise e recuperação de imagens e filmes.
Lá no comecinho a ideia era outra, bem diferente, mas após diversas conversas com minha orientadora a ideia voi modificando, evoluindo e se tornou o que é hoje. A ideia nasceu porque eu trabalhava como designer gráfico em Minas e tinha muita dificuldade em localizar imagens para realizar minhas artes gráficas, perdia muito tempo na recuperação de imagens. Aí, ao entrar na biblioteconomia, decedi que iria me dedicar a essa questão e aliar ela a uma coisa que sempre gostei: o cinema. Acredito que minha orientadora e eu estamos no caminho certo, porque até mesmo o Google lançou recentemente o recurso de recuperar imagens por cor no seu buscador. Vocês não fazem ideia de como isto é útil pra quem trabalha com arte e publicidade.
Agora esta pesquisa se tornou meu trabalho de conclusão de curso. Teve início este semestre e será concluído no próximo. De 2007 ao início de 2009 mergulhei a fundo em diversos livros importantes para análise da imagem e para entender o que é a cor. Não foi fácil, são dois temas muito complexos e interdisciplinares, principalmente a cor. Também descobri a semiótica e ela está sendo minha principal ferramenta de trabalho.
Dei um passeio nos jardins da arte, comunicação (cinema, publicidade, jornalismo), psicologia, biologia, física, química, ciências sociais... Teve horas que quase entrei em desespero, mas não desisti e descobri uma área maravilhosa. É imprecionante como a cor é importante em nossas vidas e a gente muitas vezes nem se dá conta disto.
Este semestre passei realizando os fichamentos dos textos e agora estou preparando a parte teórica, para no próximo semestre cair fundo na análise propriamente dita dos filmes do Tim Burtom. Mesmo assim, já descobri coisas fascinantes nos filmes dele, principalmente dos quatro filmes que selecionei para o trabalho: Edward Mãos de Tesoura, Peixe Grande, A fantástica fábrica de chocolate e A noiva cadáver.
Futuramente vou publicar como anda minha pesquisa, o que venho descobrindo e o que ainda falta fazer. Espero que vocês gostem e sugestões e críticas serão sempre bem vindas. Ah, também preciso contar porque escolhi o Tim Burton. É uma história engraçada
Também espero que consiga levar todo esse conhecimento que estou trabalhando para minha vida profissional no futuro. Não imaginam como é difícil definir qual é minha profissão hoje em dia, porque minha carreira tá virando uma quimera com 4 cabeças (Design, Administração, Biblioteconomia e Cinema). Meu desafio é não assustar o "mercado" com esta criatura...rzz
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